Wagner Tavares: Uma abordagem tutelar para proteger adolescentes e a sociedade

Onde está o Conselho Tutelar para tomar a frente dessas ações preventivas junto com as autoridades estaduais e municipais e até com o Ministério Público?

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Homens roubam empresário Marcelo Rubim Benchimol em Copacabana - Foto: Reprodução

A população do Rio, indignada, assiste atônita aos últimos acontecimentos da violência em nossa cidade. Mas o que fazer para mudar essa situação? Ao contrário de sempre criticar e fazer cobranças, podemos contribuir propositivamente para a questão.

Consultores jurídicos e demais profissionais que colaboram com a Associação do Cinturão Turístico do Rio de Janeiro, ao avaliarem o problema, levantaram o histórico da atuação dos poderes públicos, cada qual em sua atribuição legal, e chegaram a certas conclusões, formulando uma interessante tese, a qual, por meio deste artigo, submetemos como estratégia de trabalho às autoridades.

Preliminarmente, avaliando fatos, resta evidente que o adolescente infrator assumiu, ao longo dos anos, devido à sua inimputabilidade, o papel de principal coadjuvante no cometimento de crimes na cidade do Rio. À primeira vista, trata-se apenas de casos de polícia, mas a abordagem mais adequada para a inibição de crimes por menores poderia ser outra, além da abordagem policial de segurança pública: a proteção desses adolescentes. Essa, que é uma obrigação da sociedade, requer uma atuação articulada e conjunta entre todas as instituições e governos, para que possam contribuir para atenuar o problema da violência gerada por eles, a partir da análise de causas, condições e até omissões que possibilitam a conduta inadequada de potenciais infratores, antes mesmo da prática criminosa.

A legislação, no caso o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), garante aos adolescentes todos os direitos inerentes à pessoa humana, dentre eles o direito à liberdade, podendo estar nas ruas e áreas públicas desacompanhados de seus pais ou responsáveis, mas também, essencialmente e prioritariamente, o direito à proteção. Porém, isso não significa que medidas protetivas não possam ser aplicadas a partir da conduta desordeira dos menores.

Ao se aplicar o ECA, não se pode deixar de lado uma interpretação mais sistemática, voltada para a exigência do bem comum e os direitos coletivos, assim estabelecida pelo próprio estatuto, principalmente quanto às atribuições do Conselho Tutelar.

Para quem desconhece, o Conselho Tutelar é o órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos no ECA. Ele é o responsável pela sua proteção, nela incluída a atuação em casos de ameaça ou violação desses direitos quando em risco e em “situação de rua”.

O próprio ECA dispõe sobre o Conselho Tutelar, cujos conselheiros são escolhidos pela população, mas somente são exigidos, para se candidatarem, a idoneidade moral, residir no município e serem maiores de 21 anos. Contudo, e quanto à preparação técnica dos conselheiros? Trata-se de efetivo serviço público, porém o Estatuto silencia sobre qualificações específicas ou qualquer treinamento para o desempenho eficiente de suas funções.

Ao ser o titular dessa competência e para assegurar a devida proteção aos menores, há que se indagar se o Conselho Tutelar está exercendo bem esse trabalho, com eficiência, buscando ações integradas em conjunto com outros órgãos municipais e estaduais, tais como integrar-se com a assistência social, serviços de saúde e, além de outros, a colaboração com as autoridades policiais nos casos de violência.

É importante salientar, no contexto aqui discutido, que o Conselho Tutelar, para não ser negligente, não deve se portar apenas de forma reativa, mas também, agir preventivamente, promovendo ações e parcerias visando seus objetivos estatutários, promovendo uma abordagem mais ampla e eficaz na proteção dos direitos dos adolescentes, inclusive daqueles que saem às ruas para a potencial prática de pequenos delitos, que ultimamente atordoam moradores e visitantes do Rio de Janeiro. A lei é clara ao estabelecer que é dever de todos prevenir a ameaça ou violação desses direitos.

Os leitores vão me perguntar: mas como assim? A população é a vítima da violência desses jovens infratores. Mas lhes afirmo: todos somos vítimas e precisamos igualmente de proteção. Às polícias cabe a proteção de todos, mas é ao Conselho Tutelar que cabe estar à frente do trabalho preventivo para a proteção desses adolescentes. A garantia de sua proteção pode significar na redução de suas práticas criminosas, aliviando e protegendo a sociedade que passou a ser refém da insegurança nas ruas, como no bairro de Copacabana. A solução prática vem no trato da aplicação conjunta do próprio ECA.

Tendo mencionado acima vários dos seus artigos, analisemos agora o seu artigo 98, que estabelece medidas de proteção dos adolescentes, aplicáveis sempre que seus direitos estiverem ameaçados ou violados por falta ou omissão dos seus responsáveis, e também em razão de suas condutas. Não seria esse o caso? A ameaça aos direitos dos menores, por si só, não só já legitima, mas impõe a atuação efetiva do Conselho Tutelar nas ruas da cidade. Mas não é isso que estamos assistindo.

Onde está o Conselho Tutelar para tomar a frente dessas ações preventivas junto com as autoridades estaduais e municipais e até com o Ministério Público? Ele tem a obrigação de intervir diante da situação quando necessário, para tutelar os direitos, prover proteção integral, intervir quanto à responsabilização parental e atender aos pais ou responsáveis quanto à obrigação de informações sobre os adolescentes desordeiros. O Conselho Tutelar tem o dever-poder de abordá-los para colher essas informações, mesmo sem a fragrância de qualquer delito, tão somente pela conduta notória de andarem em “bandos” gerando desordem e transtornos nos transportes públicos e nas ruas. Apesar dessa conduta não ser criminosa, resta evidente tratar-se de conduta imprópria e inadequada diante do dever de urbanidade de todo cidadão, inclusive dos adolescentes.

Onde estão aqueles que detêm a guarda desses adolescentes para serem aconselhados, orientados e informados da conduta de seus filhos e até, se for o caso, serem responsabilizados? Estariam os adolescentes matriculados e frequentando a escola? Necessitariam eles, de algum tipo de tratamento, como psicológico ou psiquiátrico? Como sabê-lo sem a abordagem do Conselho Tutelar acompanhado de profissionais de saúde e, obviamente, de policiais ou guardas municipais para garantir a sua segurança e a imperatividade de suas decisões.
No interesse superior dos adolescentes, como ressalta a lei, é o Conselho Tutelar quem detém o poder-dever de intervir para essa verificação, podendo, inclusive, em certas circunstâncias, encaminhar os menores aos seus pais. E, consequentemente, ao intervir para proteger os direitos dos adolescentes, estes não mais poderiam andar nas ruas sem serem incomodados com a abordagem tutelar, já que são o objeto inalienável dessa obrigação. A rotina nessa atuação conjunta, de certo, geraria menos violência por parte dos menores infratores.

Registro que, conforme a lei, suas identidades e imagens devem ser preservadas – é claro! Mas não se pode mais aceitar que o Conselho Tutelar espere o problema chegar até ele somente após a conduta dos adolescentes se transformar em delito penal. O dever de proteção não nos parece estar sendo devidamente exercido, pois o obriga a agir preventivamente. Isso não vem ocorrendo nas ruas da cidade e, sendo assim, está sendo negligenciado.

Deixo claro que não estamos a propor aqui a privação de liberdade e apreensão dos adolescentes sem o cometimento de qualquer crime ou contravenção penal. Mas, efetivamente, já é a hora da sociedade e suas organizações representativas exigirem do Conselho Tutelar uma ação mais pragmática para proteger os adolescentes flagrados em conduta imprópria nas ruas. Nossa tese é que, protegendo esses menores, já estaremos protegendo também a sociedade e a cidade.

Assim como ressaltado acima, o inciso I do artigo 136 do ECA é objetivo ao atribuir ao Conselho Tutelar o atendimento de adolescentes nos casos previstos nos arts. 98 (omissão dos pais e em razão da conduta dos adolescentes), aplicando-se medidas protetivas previstas no art. 101.

Logo, nessa situação reiterada nas ruas do Rio, por que é tão difícil para o Conselho Tutelar tutelar e agir preventivamente junto com os governos estaduais e municipais.

Independentemente de previsão legal, concluímos que o Estado ou os Municípios precisam prover qualificação técnica e operacional aos conselheiros, além de disponibilizar a eles o efetivo apoio prioritário de seus órgãos, como, aliás, o ECA assim o prevê. O Conselho Tutelar precisa assumir de vez o protagonismo das iniciativas para obtermos soluções para os adolescentes em baderna pelas ruas e para a população do Rio.

Precisamos proteger os adolescentes antes mesmo de cometerem crimes e serem maculados como menores infratores por toda vida. Isso é cumprir o ECA e o dever constitucional de eficiência do Conselho Tutelar. Assim também, estaremos protegendo os cidadãos e turistas da nossa cidade, pois o Rio merece um trabalho conjunto e eficaz em prol do bem-estar de todos os cariocas.

Wagner Tavares é administrador, consultor em gestão pública, com MBA em administração estratégica e Presidente da Associação do Cinturão Turístico do Rio de Janeiro.

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1 COMENTÁRIO

  1. Com a palavra aqueles que perdem entes queridos sob ação desses mesmos adolescentes infratores (não se pode chamar de criminosos) e que não puderam ter suas vidas protegidas e poupadas aplicando ações preditivas que se antecipassem aos crimes.

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