Quando presidi o Instituto Estadual de Engenharia e Arquitetura do Rio de Janeiro (IEEA-RJ) encaminhamos à Secretaria Estadual de Infraestrutura e Obras, em 3 de março de 2020, a proposta do Programa Morar Saudável, uma iniciativa dedicada à mitigação do nosso déficit habitacional, com foco em melhorias e adaptações. A metodologia adotada pela Fundação João Pinheiro (FJP) mostra que há déficit habitacional em quatro situações: a) domicílios precários; b) situação de coabitação, quando mais de uma família compartilha os mesmos cômodos; c) domicílios cujo valor do aluguel compromete mais de 30% da renda total dos habitantes; e d) domicílios alugados com mais de três pessoas utilizando o mesmo cômodo.
Os números são ruins: apenas na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, o Plano Estratégico de Desenvolvimento Urbano Integrado estimou em 390 mil unidades o déficit da região, composta por 22 municípios, e que representa 74% da população estadual. E a recente tragédia das chuvas em cidades como Petrópolis, Angra dos Reis e Paraty, entre outras, revelou também essa deficiência e os graves efeitos que acarreta.
A proposta do Programa Morar Saudável, encaminhada pelo Processo SEI 1700400056/2020, prevê também a parceria do Governo estadual com os municípios, através da Subsecretaria de Habitação, para a promoção de reformas em domicílios localizados dentro do perímetro das Zonas de Especial Interesse Social (ZEIS), cujo objetivo, como descrito no ofício do IEEA, seria promover melhorias internas nos cômodos para torná-los acessíveis às pessoas com deficiência, reformas em banheiros, nos casos de extrema inadequação e melhoria da ventilação e iluminação naturais no interior das casas. Na sequência, foi mencionada a lei federal nº 11.888/2008, mais conhecida como Lei de Assistência Técnica, que assegura às famílias de baixa renda assistência técnica pública e gratuita para o projeto e a construção de habitação de interesse social.
Lembramos também que o Programa Morar Saudável poderia promover parcerias com as faculdades de arquitetura para ampliar o quadro técnico com vistas ao trabalho de campo, naquilo que se referia à elaboração de estudos de cada caso para o desenvolvimento de soluções arquitetônicas. Os recursos para a promoção dessas reformas domiciliares em áreas de especial interesse social viriam do Fundo Estadual de Habitação de Interesse Social (Fehis), lei estadual nº 4.962/2006, que tem entre as suas finalidades “promover e viabilizar com equidade e celeridade, o acesso e as condições de permanência na habitação, com conforto ambiental, saúde da sociedade, acessibilidade (…)”
É preciso deixar claro que a demanda por políticas públicas habitacionais permanentes é imensa. Segundo a mesma Fundação João Pinheiro, dados revisados considerando o ano-base de 2019, demonstraram que algum tipo de inadequação residencial chega a 24,8 milhões de moradias no Brasil. As inadequações se referem a três categorias: fundiária; de infraestrutura urbana; e dos próprios imóveis, como a falta de espaço, ausência de banheiros, cobertura e piso inadequados.
O ano de 2022 começou com uma série de catástrofes climáticas com vítimas fatais, a exemplo das ocorrências em Petrópolis, Angra dos Reis e Paraty.
Os desastres recentes em decorrência das fortes chuvas fizeram reviver na opinião pública questionamentos sobre a causa e efeito da tragédia de 2011, que devastou a Região Serrana do Rio de Janeiro. Numa consulta realizada em 29 de março desde ano no site da Secretaria Nacional de Habitação, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Regional, pude identificar que 63 dos 92 municípios fluminenses apresentam algum tipo de pendência frente às exigências do Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social (Snhis).
Não restam dúvidas de que o planejamento urbano é uma prioridade, principalmente quando se considera a necessidade de identificar áreas seguras e acessíveis para a implantação de conjuntos habitacionais dignos e seguros, destinados à população de baixa renda. Já se passaram dois anos da iniciativa do IEEA-RJ e esse tipo de política pública precisa ser estruturada como política de estado, porque os verões chuvosos chegam sem falha.
Este é um artigo de Opinião e não reflete, necessariamente, a opinião do DIÁRIO DO RIO.