Campo Grande, Guaratiba e Jacarepaguá. Os três bairros lideram, de acordo com dados coletados desde 2017 pelo programa Linha Verde do Disque Denúncia, o ranking de desmatamento da cidade do Rio de Janeiro. Nos espaços desmatados dessas localidades as construções de condomínios (alguns de alto padrão) irregulares em áreas de preservação ambiental são recorrentes.
Em 2022 foram 40 denúncias de desmatamento irregular em Campo Grande. Em Guaratiba e Jacarepaguá 31 casos foram denunciados. Em 2019, o bairro que lidera o ranking teve 111 registros.
Dados do programa Linha Verde, do Disque Denúncia
Em 2021, um condomínio de luxo com 35 mil metros quadrados estava com as obras avançadas, no bairro de Campo Grande. Uma ação da Prefeitura do Rio, com as secretarias de ordem pública e meio ambiente, derrubou a estrutura. Contudo, essa não foi a primeira nem a última tentativa de construções irregulares na região.
Neste caso específico foram constatados diversos danos ambientais decorrentes de obras para implantação do loteamento clandestino, que fica na zona de amortecimento do Parque Estadual da Pedra Branca.
Na ocasião, Nilton Caldeira, à frente da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, destacou que a Prefeitura estava atenta aos casos de construções ilegais em áreas preservadas e iria continuar atuando fortemente para coibir irregularidades.
“Temos mais um caso de um empreendimento ilegalizável: lotes com uma série de crimes ambientais dentro da Pedra Branca. Fica o alerta sobre a importância de consultar os órgãos competentes antes para saber o que ou se é permitido construir no local. No Rio, hoje, investir em áreas protegidas para fazer construções irregulares é um péssimo negócio”, disse.
Guaratiba, o segundo bairro na lista dos que mais têm casos de desmatamento no Rio de Janeiro, no ano passado, viu pela segunda vez o mesmo condomínio ilegal que estava sendo construído ser posto abaixo.
No mês de junho de 2018, a Prefeitura do Rio já havia realizado uma grande operação para demolição de toda a infraestrutura do mesmo loteamento. Na ocasião, foram desmobilizados o portão principal e a guarita, além de ter sido retirado o quadro de luz e o meio-fio. Apesar disso, o responsável continuou com a prática ilegal de exploração imobiliária de áreas públicas e privadas, contribuindo para o histórico de desmatamento de floresta em favorecimento do crescimento imobiliário desordenado na região.
“Além de toda problemática de degradação ambiental que acontecem por conta dessas construções irregulares em áreas de preservação, falta ao munícipio do Rio de Janeiro mais mecanismos de fiscalização para conter esses crimes. É preciso mais estrutura, mais servidores, mais capacitação. Sabemos que combater diretamente esses grupos criminosos não é função direta do munícipio, mas a Prefeitura pode colaborar e deve atuar na preservação do bioma Mata Atlântica. Outra coisa importante é que nessas regiões, muitas pessoas estão desenvolvendo agricultora familiar, e quase sempre sem nenhum apoio do Poder Público. Em Guaratiba, por exemplo, tem a Associação dos Produtores Rurais de Guaratiba, que luta para desenvolver a atividade do cultivo de plantas ornamentais, que é um mercado muito promissor. Grupos assim ajudam que tenhamos um melhor uso dessas áreas e auxiliam na proteção das mesmas”, pontua Antônio Marcos Barreto, vice-presidente nacional da Associação Nacional de Municípios e Meio Ambiente, a ANAMMA.
Doze casas, em dois pavimentos, foram erguidas sem licença ou acompanhamento de profissionais habilitados, além do início da construção da fundação de mais seis unidades. Os imóveis, que ficavam em Jacarepaguá, foram demolidos pela Prefeitura em setembro do ano passado. Engenheiros do município estimam que R$3,5 milhões tenham sido investido nas construções.
Também em Jacarepaguá, no Anil, mais um condomínio demolido. Este foi em janeiro de 2023. O terreno, equivalente a sete campos de futebol, foi desmatado ilegalmente e estava recebendo arruamento, postes a até guarita. Durante a operação, os agentes da Prefeitura encontraram supressão de vegetação, construções sem licença, parcelamento irregular do solo e outros crimes ambientais.
Bairros com mais desmatamento são dominados por grupos milicianos
O Mapa Histórico dos Grupos Armados do Rio, divulgado em setembro do ano passado pelo Instituto Fogo Cruzado e pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni/UFF), mostra que a região que corresponde aos três bairros que lideram o ranking de desmatamento da cidade do Rio é dominada pela milícia.
Em destaque a área onde ficam Campo Grande, Guaratiba e Jacarepaguá. Mapa: Instituto Fogo Cruzado e pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni/UFF)
De acordo com o estudo, as áreas dominadas pelas milícias cresceram 387,3% nos últimos 16 anos no Rio de Janeiro. Ainda segundo as pesquisas, os grupos milicianos nos últimos anos vêm tirando a atenção de favelas para os conjuntos habitacionais e sub-bairros no chamado “asfalto”. Em 2008, pouco mais de 40% das áreas exploradas por milicianos tinham esse perfil. Mas hoje 80% dos domínios são no asfalto e apenas 20% em comunidades.
“As milícias também entram em disputas territoriais violentas e atuam em territórios cada vez mais extensos, onde controlam esses bairros ilegalmente, cobrando taxas extorsivas sobre os mercados de serviços essenciais como água, luz, gás, TV a cabo, transporte e segurança, além do mercado imobiliário”, ressalta o pesquisador Daniel Hirata.
A atuação de milícias na construção de imóveis ilegais no Rio de Janeiro resultou em mortes. Os casos de desabamentos de construções no Rio das Pedras e na Muzema, na Zona Oeste do Rio, ganharam notoriedade nacional.
No início de 2022, a Prefeitura do Rio e o Ministério Público, com apoio da Polícia Militar, da Guarda Municipal e da Polícia Ambiental, realizam uma ação de demolição de construções irregulares, que seriam ligadas à milícia da comunidade de Rio das Pedras, entre os bairros Itanhangá e Jacarepaguá.
Em janeiro deste ano, quatro construções irregulares foram demolidas em uma operação do Ministério Público com a Polícia em Campo Grande. Os criminosos, envolvidos com a milícia, lucraram cerca de 6 milhões de reais com os imóveis.
A Polícia informa que investiga a ação de grupos criminosos por trás de obras irregulares na cidade e Região Metropolitana do estado.
Caso o poder público não atue com rigor o Rio de Janeiro que já é conhecido como um dos estados mais desestruturados não conseguirá ter o domínio sobre os milicianos. É uma pena ver o RJ nessa situação.
Sem contar os cortes de árvores das ruas, principalmente na Tijuca, feitos pela Prefeitura.