No último dia 27/09, Daniel Soranz, responsável pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS) da cidade do Rio, publicou no Instagram uma foto em uma academia de ginástica com a seguinte legenda: “Gradativamente voltando à rotina”. Desde que assumiu a Secretaria no início do atual mandato de Eduardo Paes, Soranz, que teve a gestão elogiada nos últimos governos Paes à frente da SMS, direcionou todos os esforços ao combate à pandemia causada pelo Coronavírus. Atualmente, com os números de internações e mortes por Covid-19 caindo no Rio de Janeiro, a dedicação passa a ser dividida com outros problemas. A agenda continua cheia. Bem cheia.
Em julho de 2020, ainda na gestão Marcelo Crivella, em entrevista ao DIÁRIO DO RIO, Daniel Soranz disse que acreditava que a pandemia iria estar controlada até o fim do ano, no caso, o ano passado. Médico sanitarista, especialista em Medicina da Família e Comunidade, mestre em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Ensp), pesquisador e professor da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Soranz, como muitos especialistas, foi surpreendido pela força acachapante da doença. Ainda fora da Prefeitura, Daniel contou que viu com muita apreensão tudo o que estava acontecendo.
“Eu queria muito estar na posição de compor a saúde primária, de conduzir a pandemia à frente da Secretaria. É muito ruim, você ver sua cidade, onde você mora, fazer as coisas erradas, que sabíamos que não iam dar certo. Eu tinha certeza que hospital de campanha não iria funcionar, que íamos perder recursos com isso. Eu sabia o que tinha que fazer, então, queria muito estar nessa condução nesse primeiro ano de pandemia. Eu ficava na Fiocruz angustiado, estudando. A saúde pública é meu objeto de estudo, meu interesse. Então, eu sabia quais botões tínhamos que apertar e via o horror que estávamos passando com a gestão anterior, com um número de mortes tão alto”.
De fato, a agenda de Daniel Soranz é movimentada. No dia 15/10, a reportagem do DIÁRIO DO RIO acompanhou parte da rotina do secretário. As atividades começaram com uma coletiva de imprensa, na qual foi anunciado que algumas medidas restritivas poderiam ser relaxadas na cidade do Rio de Janeiro, considerando o arrefecimento da pandemia na cidade do Rio de Janeiro, após o aumento da vacinação. Na mesma coletiva, outro tema foi destaque: a briga da Prefeitura com a Light, que havia cortado a energia elétrica de prédios da gestão municipal, dias antes.
Enquanto acompanhava os trabalhos do projeto Vacina Maré, no Complexo da Maré, Daniel Soranz também aproveitou para ver as reformas que estão sendo realizadas nas clínicas da família da região. Em uma delas, na Jeremias Moraes da Silva, voltou a ter energia elétrica normalmente, sem precisar contar com um gerador, como foi na gestão de Marcelo Crivella. De acordo com pessoas que trabalham na Clínica, esse sistema de geração de energia prejudicava o trabalho, pois não dava conta de fazer com que todo o prédio tivesse cobertura de luz. A mudança foi tão significativa que até uma faixa e uma pequena festa foi montada para receber o secretário.
Thiago Wendel, coordenador da Secretaria de Saúde na região da Maré, explicou que as sete clínicas da família do Complexo estão passando por reformas. Ele conta que, na gestão anterior, foram anos sem comprar material básico para o trabalho funcionar, incluindo cadeiras, uniformes e reformas essenciais, como pintura, corte de grama e reparos em aparelhos de ar-condicionado.
Os dados da Secretaria Municipal de Saúde mostram que no início do ano eram 2.700 aparelhos de ar-condicionado quebrados na rede e atualmente são 700. “Ainda é muito, mas é bem menos do que tínhamos quando assumimos. E vamos melhorando. É muito importante cuidar da questão estrutural”, diz Soranz.
Thiago, um dos funcionários que retornou à Secretaria na nova gestão Paes, frisa que Daniel Soranz é um chefe que cobra bastante: “Fazemos reuniões, às vezes, tarde da noite. Mas sabemos que é importante para o trabalho, que é bem corrido o dia todo“. Thiago também aponta outro lado do responsável pela Secretaria de Saúde do Rio, “ele é muito querido por todos”. Isso, ele não precisaria falar. Nas três clínicas da família que visitamos com Soranz naquela quente manhã de sexta-feira, deu para perder a conta de quantas pessoas pediram para tirar uma foto com o secretário.
Entre os tantos pedidos de fotografias, ou selfies, estavam as agentes de saúde Michele e Ieda, que foram afastadas durante a gestão Crivella e voltaram neste novo mandato de Eduardo Paes, com Soranz, novamente, como secretário de saúde. “O Daniel se preocupa com cada detalhe das clínicas, do trabalho dos agentes. Ele tem muito carinho por tudo e por todos”, disse Ielda, na Clínica Adib Jatene.
A rede municipal de saúde perdeu 6 mil profissionais durante a prefeitura de Marcelo Crivella. Recuperar esses postos de trabalho não é fácil, porque, por exemplo, os atrasos de salários da última gestão e as más condições de trabalho afastam profissionais. O remédio para o problema, aplicado pela Secretaria de Saúde vem sendo: retomar gratificações de distância para médicos que trabalham em áreas mais afastadas do Centro da Cidade; de titulação para especialistas e pessoas que têm mestrado, doutorado e gratificações de responsáveis técnicos. Todos nessas condições, ganham a mais para trabalhar.
“Estamos, gradualmente, recuperando. Começamos em uma área mais crítica, a Zona Oeste, e agora estamos passando pela recuperação da Zona Norte para chegar no Centro e na Zona Sul. Já recuperamos 2 mil e 900 desses cargos e com processos seletivos para recompor todos os postos de trabalho perdidos nos últimos anos, chegarmos até 3.500 funcionários da saúde ainda esse ano. O restante fica para o ano que vem. Ficaria, mais ou menos, uns 3 mil funcionários para gente recompor em 2022 e isso está dentro da nossa meta, do nosso planejamento”, explicou.
Um dos funcionários que não saiu na última gestão e continua na ativa até hoje em dia, porque ama o que faz, é o Senhor Emílio. Segunda pessoa mais antiga trabalhando na Secretaria Municipal de Saúde. Ele pediu para tirar uma selfie com Soranz. Que solicitou uma em troca, dizendo que o ativo senhor era uma inspiração.
Definitivamente, muita gente voltou a trabalhar na saúde pública do Rio de Janeiro quando Daniel Soranz regressou ao posto de secretário. Valdecir, um homem de apelido curioso, é um deles. “Morreu”, como ele também é chamado, é articulador de saúde da Secretaria no Complexo da Maré. “Todo mundo ficou muito feliz com a volta do Daniel. Todo mundo gosta dele. É só você ver aí, toda hora é foto, gente agradecendo a ele porque recuperou o emprego, feliz com as clínicas funcionando melhor”, contou.
Acompanhando a campanha Vacina Maré e as recentes reformas nas clínicas da família da região, Soranz ainda tirou tempo para trabalhar um pouco mais e vacinou algumas pessoas. Rafa Pereira, fotografo do DIÁRIO DO RIO, foi uma delas.
A Prefeitura informou que as comunidades do Complexo da Maré são um dos locais da cidade com menor taxa de transmissão e índice de internação por Covid-19. Tudo graças à campanha Vacina Maré. Na primeira etapa do projeto, que aconteceu entre os dias 29 de julho e 1° de agosto, quase 37 mil pessoas foram vacinadas, superando a expectativa inicial da ação que era imunizar 30 mil moradores da comunidade. A segunda etapa foi até o dia 17 de outubro.
O Complexo da Maré foi escolhido pela Fundação Oswaldo Cruz, em parceria com a ONG Redes da Maré, para estudar a efetividade da vacina, medindo anticorpos e verificando a taxa de proteção direta conferida e a imunidade de rebanho (proteção indireta); a ocorrência de eventos adversos pós-vacinais nos imunizados; a transmissão e circulação de diferentes variantes; e a dinâmica epidemiológica do coronavírus no complexo de comunidades. Soranz, que é professor na Fiocruz, está orientando Janaina em sua tese, aluna da instituição.
A aluna, que estava com a equipe na Maré, questionada se conseguia falar com o professor em meio a tanto trabalho, disse: “A gente se fala nos horários possíveis. Quando ele para de trabalhar. Tem dias que é 11 da noite”.
Soranz conta que, muitas vezes, é na hora do jantar que ele consegue dar os prognósticos à sua aluna. “Pedimos algo para comer e ficamos lá, conversando”.
A hora da refeição é uma hora sagrada. Porém, depende. Enquanto almoçava, o telefone do secretário de saúde tocou e quem atendeu foi o médico. Soranz deu umas dicas a um paciente impaciente que precisava ouvir o doutor.
Depois do almoço, uma porção de reuniões. Algumas bem rápidas, na Prefeitura mesmo, conversas curtas, nas mesas dos servidores da saúde, para ajustar algo sobre o funcionamento da Secretaria. Outras mais longas e mais tensas.
Entre elas, um encontro no Hospital Souza Aguiar, que na sexta-feira 15/10, havia zerado as internações por Covid-19. No Hospital funciona a Central do Sistema de Regulação (Sisreg), uma espécie de Centro de Operações da Saúde. É lá que todo o sistema de inteligência e coordenadas da Secretária são projetados. À mesa estava a discussão para diminuir as filas nos hospitais públicos.
Em um clima mais “nervoso”, os setores representados na reunião discutiam, cada um defendendo seu ponto, as soluções para o problema. Com as internações e mortes por Covid-19 caindo, a Secretaria começa a abrir o leque de ações.
Atualmente, como mostram os dados da Prefeitura (foto abaixo), a fila do Sisreg está assim:
“Para algumas coisas já estamos conseguindo resolver. Por exemplo, mamografia, a gente começou este outubro rosa já sem filas. As mulheres que quiserem marcar o exame na rede pública municipal conseguem sem problemas, demora”, falou o secretário.
A reunião mais tensa serviu para o secretário brincar (mas falando sério): “Isso aí é para o pessoal do DIÁRIO DO RIO não achar que tudo é elogio, foto. Tem muita cobrança. De mim para eles e deles para mim”.
O Souza Aguiar não é o único hospital que está zerando as internações por Covid. Felizmente, essa é uma realidade em todo o Rio de Janeiro. Eis a importância da vacina, que foi bem recebida pela população do Rio. “Estamos dando um show na vacinação. Todo mundo colaborando, se vacinando”, comemorou Soranz.
No entanto, nem tudo é alegria. Minutos depois da reunião sobre o Sistema de Regulação, chega a notícia de que a vacinação da dose de reforço precisaria ser suspensa no Rio de Janeiro. O motivo: atraso nos repasses das vacinas. Situação que se repetiu algumas vezes não só no Rio. O secretário contou que as tratativas com o Ministério da Saúde vinham sendo boas na gestão Marcelo Queiroga até o início da campanha de vacinação de adolescentes. O fato deu uma agulhada nas relações.
Recentemente, o DIÁRIO DO RIO publicou que Daniel Soranz poderia ser candidato ao governo do estado do Rio. O secretário desmentiu, mas confessou que a ideia existiu. Sem o carimbo dele, mas existiu. Contei a Soranz que ouvi um servidor dizer que apostava que o secretário seria ministro da saúde um dia. Soranz sorriu.
A relação entre Daniel Soranz e os servidores da saúde é muito boa. Chama todos pelo nome, conversa de igual para igual. Os funcionários, mesmo quando Soranz não está perto, elogiam o chefe. O secretário brincou que agora está com uma dificuldades, porque muitos desses trabalhadores, que não tiraram férias durante o período mais agudo da pandemia, estão pegando uns dias para descansar.
O mês de novembro que se aproxima será determinante nesta nova fase da pandemia. Nos dias que se sucedem, o prefeito Eduardo Paes promete relaxar ainda mais as medidas de contenção ao vírus, inclusive desobrigando o uso de máscaras. Também é esperado que as metas de vacinação sejam alcançadas no penúltimo mês do ano de 2021. Tudo seguindo as orientações do Comitê Cientifico da Prefeitura e da Secretaria Municipal de Saúde.
No Dia do Médico, o Eduardo Paes postou uma mensagem para Daniel Soranz.
Diferentemente do prefeito, um folião convicto, que posta bastante sobre tudo nas redes sociais, Soranz é mais discreto. Apesar disso, o secretário diz não tomar grandes cuidados para blindar sua vida fora do trabalho – que acaba mesmo tomando a maior parte dos seus dias. Na sexta-feira que a reportagem do DIÁRIO DO RIO acompanhou Daniel Soranz, ele não foi à academia. Não deu tempo. Não sextou.
“Eu até coloquei na agenda pública a academia todos os dias, mas nem sempre dá. São muitos compromissos, então, é a primeira coisa a cair. Mas é importante divulgarmos essas ações nas redes para que as pessoas façam exercícios, diminuam o nível de stress, sobretudo nesse período que estamos vivendo, no qual as pessoas tendem a ficar mais estressadas mesmo”. Então, a reportagem questionou: “Imagina o nível de stress de um secretário de saúde em um pandemia”. Ele respondeu: “Pois é. Acaba sendo inevitável. Então, se não olharmos para isso, também, causa ainda mais problemas”. Saúde é o que interessa.